“Fracassei em tudo o que tentei na vida. Tentei alfabetizar as crianças brasileiras, não consegui. Tentei salvar os índios, não consegui. Tentei fazer uma universidade séria e fracassei. Tentei fazer o Brasil desenvolver-se autonomamente e fracassei. Mas os fracassos são minhas vitórias. Eu detestaria estar no lugar de quem me venceu.” – Darcy Ribeiro (1922-1997)Este início de 2017 foi pródigo em acontecimentos lamentáveis. Fez-me recordar do arquiteto Edson Saad, colega há mais de quarenta anos no Departamento de Obras Públicas de São Paulo (DOP), que relatou certa vez ter sido radical com seus pais ao lhes proibir terminantemente ler jornais e assistir TV. "Fiz isso pelo bem-estar deles, porque vivem deprimidos o tempo todo, pois sempre estão alarmados com as crises, com assaltantes e ladrões devido a tudo que leem e ouvem. Vão morrer antes do tempo só por isso”. A revista Veja de 11 de janeiro retratou de maneira espetaculosa as chacinas entre facções do crime organizado, que começaram no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), em Manaus, e espalharam-se como metástase por vários outros presídios. E chacina com requintes de crueldade, uma explosão de barbárie, com presos decapitados, desmembrados e incinerados. Superlotação das celas imundas infestadas de ratos e baratas e todos amontoados como animais à espera da degola. Dados do último Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen), do Ministério da Justiça, preveem que, se o crescimento da população carcerária mantiver o ritmo, em 2022 o Brasil superará a marca de 1 milhão de detentos mostrando que Darcy Ribeiro estava certo quando profetizou, em 1982, que “se os governantes não construírem escolas, em 20 anos faltará dinheiro para construir presídios”. "Investimento em educação reduz a vulnerabilidade das pessoas, que ficam menos expostas ao crime. É fato científico”, afirma o pesquisador Rafael Alcadipani, professor da Fundação Getúlio Vargas e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Já em 2013 um estudo do departamento de Economia, Administração e Sociologia da USP mostrava que, para cada investimento de 1% em educação, 0,1% do índice de criminalidade era reduzido. A pesquisa tomou por base como o gasto público em educação entre 2000 e 2009 impactou na redução da taxa de homicídios. Concordo a professora Vanessa de Barros, do Departamento de Psicologia da UFMG e integrante do Observatório Nacional do Sistema Prisional, quando diz que a escola é meio de transformação. “Mas estamos falando de uma boa escola: com professores valorizados, bem formados, para que crianças possam sonhar com um futuro que não seja miserável. Estamos falando de adolescentes e jovens que moram nas periferias, lugares mais vulneráveis”. A psicóloga garante que os dados apontam que a escolaridade na população carcerária é baixa e que a realidade mostra que se as escolas fossem boas de fato, eles poderiam ter um futuro melhor. A edição da Veja no início do ano também trouxe “O fausto da senhora Cunha”. Como um bofetão na nossa cara, a matéria reproduziu trechos de conversas no WhatsApp de Cláudia Cruz, mulher de Eduardo Cunha, com amigas. Outra reportagem (“Deboche aéreo do governador”) revela que, enquanto Minas Gerais atrasa salários, seu governador usa helicóptero do estado para buscar o filho numa festa de ano novo, coisa que muitos políticos são useiros e vezeiros em praticar. Sem esquecer das roubalheiras de Sérgio Cabral e esposa fizeram às nossas expensas! Ou seja, o gênero humano é complicado! Ninguém sabe como funciona a ânsia de poder e de dinheiro das pessoas. Na teoria, toda a roubalheira brasileira não devia acontecer com gente que frequentou boas escolas, que não nasceu em periferia, nem morou em favelas. Nem sei se existem pesquisas que mostrem as razões e o que lhes tenha faltado na escola, no que concerne ao respeito, ética, solidariedade, civilidade e cidadania. Início do ano passado, neste mesmo Blog, falei que a mídia deveria equilibrar as más notícias com as boas, para não dar ao mundo a visão de que somos um país de horrores ou de bandalheiras, porque tantas ações boas acontecem e não têm divulgação, nem ao menos para aumentar a nossa autoestima. Finalmente, parece que a mídia abriu os olhos! No último domingo, dia 22, tive a satisfação de ler a auspiciosa notícia do lançamento da seção “Dias Melhores”, seção só com notícias positivas, que poderia ter começado com os dois exemplos abaixo: Com a picardia que lhe é própria, o jornalista Elio Gaspari, no último dia 15, afirma que o Brasil dá certo, ao trazer a notícia de que seis jovens do ensino médio do Rio de Janeiro mergulharam no crowdfunding [a popular vaquinha social] para arrecadar fundos (no mínimo R$ 44 mil para custear as viagens), porque eles foram aceitos para representar o Brasil no torneio de matemática da Universidade de Harvard e do Massachusetts Institute of Technology (MIT). Ainda bem que existem os mecanismos de ajuda na web, porque as entidades do estado nenhuma lhes deu guarida. Ninguém moveu palha para que estudantes que já haviam conquistado mais de cem medalhas em matemática, física, astronomia e robótica representassem o Brasil no certame, que reúne centenas de jovens de todo o mundo. O relevante é que na “vaquinha” conseguiram quantia bem superior ao solicitado, o que mostra que o brasileiro é solidário às boas iniciativas. Mas o mais extraordinário aconteceu em Pernambuco. Sebastião Pereira Duque, 72 anos, catador de lixo, dá exemplo de solidariedade ao construir uma escola para 75 crianças. Há 24 anos puxando uma carroça pelas ruas de Olinda, ele também constrói barracos para quem não tem onde morar. A escola Nova Esperança mexe com os brios de todos nós, principalmente com aqueles que pensam que escola boa para melhorar o desempenho dos brasileiros é um problema só do governo. Precisamos entender que esse é um problema de todos nós. O que seu Sebastião está fazendo é um tapa na cara de todos que pensam que milhares de horas discutindo currículos em congressos resolve alguma coisa. Temos 150 mil escolas de ensino fundamental que não vão bem. O que cada um de nós pode fazer, dentro de suas possibilidades, tendo como exemplo o cidadão Sebastião Pereira Duque? Este sim que é um desafio para valer, pois milhares de Sebastiões certamente poderão dar outro jeito no Brasil.